domingo, 23 de agosto de 2009

Que ebó


No caminho da Estrada de São Lázaro, indo pra aula de História da África em um dia de sexta-feira encontro em um poste dois pratos de isopor. Um tinha a cor azul e o outro era branco. Até aí seria normal pra qualquer pessoa. Mas o que estava dentro desses recipientes coloridos e a disposição desses elementos em meio a tal localidade é que toma tudo, no mínimo curioso e intrigante.
Dentro desses pratos havia rodelas de tomate, cebola e pimentão. Fato que olhado de forma corriqueira seria um resto de alguma salada, lixo residencial ou algo do tipo, entretanto, quando há uma apuração mais específica, existe o questionamento: o que é isso mesmo? E de forma grosseira surge: Que bozó é esse? Diferente não? Antigamente não era assim! Não se faz mais como antes!
Seria uma oferenda a Yemanjá de forma light-diet e a la vinagrete?
E ainda questionando... de que terreiro saiu tal proposta de trabalho? Seria de uma casa em forma de academia que tem o acompanhamento nutricional com um pai de santo personal trainer e as filhas de santo super saradas, com altas roupas ligadas ao corpo e um torço na cabeça? Os atabaques seriam em forma de anilas (pesos)?
Preferi não devagar mais e passar para o lado crítico da reflexão, mas ainda calcado em muitas questões.
Um ebó; pensei ter elementos como um senhor prato de barro, alimentos nada dietéticos, mas que jamais impactaram na beleza e candura dos Orixás e das iaôs; com uma amarela farofa de dendê, um denso e atraente vatapá, a luminosidade de velas coloridas; dependendo da entidade, cachaça e muitos outros elementos já bastante conhecidos e repassados de geração em geração. “Para não perder o costume”. Há o início de uma sensação de injustiça, intrometimento sem conhecimento de causa, a necessidade de “desafricanizar” a coisa, de forma sorrateira, como tem sido o preconceito nos tempos,
e ouve-se expressões do tipo: eu não tenho nada contra, só não me envolvo nestes coisas! ( Como se não tivesse nome).
Talvez realmente tenha visto um bozó mesmo, algo que não tem significado em nenhum dicionário, que é uma palavra desconhecida pala tradição africana e que dentro do contexto citado não pode ser pisado mesmo, pois as quedas proporcionadas pelos condimentos existentes seriam dignas de se chamar de malditas e causadoras de danos horríveis como a paraplegia.
Voltando para a atualidade, e ainda questionando, a inovação seria necessária dentro de um contexto religioso em que a essência está na tradição? Somente pelo fato de inovar? Só porque ser diferente está na moda, e de tanto muitos quererem ser diferentes se tornam igual por querer ser diferente, pois adotam as mesmas diferenças.
Não se trata de rejeitar o que há de novo, pois o que útil e serve para melhorias será sempre bem vindo, mas o desrespeito e invasão sem nem sequer pedir licença a uma cultura já sedimentada e completa, através de artifícios importados e que veladamente possui cunho racista, nada tem a acrescentar ao candomblé.


Jucimar dos Santos - Graduando em História pela Universidade Federal da Bahia e militante-artístico.

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